2º Dia - Início de uma saga cheia de reviravoltas, interrogações e muito medo
30 de novembro de 2019 (Sábado)
Você sabia que quando o
atestado de óbito não traduz a realidade da morte, ele ofende a moral da
família? Omitir a causa básica é crime! Negar as circunstâncias, principalmente
envolvendo questões sanitárias, quando a notificação é obrigatória e
compulsória, é crime. No caso de minha mamy, depois de cinco (ou mais)
infecções hospitalares, foi registrado no óbito o que se chama de causa
terminal ou imediata, o momento final. Acontece que de acordo com a legislação e os
manuais, o mais importante é o evento que iniciou o processo de morte.
Mas esse capítulo já seria o
final da saga, tipo spoiler. Nesse segundo dia, ela ainda estava na emergência,
aguardando uma vaga de internação, que se não me falha a memória demorou mais
de 24 horas. Estávamos preocupadas, mas nem por um minuto imaginávamos que de
lá ela não sairia viva. Acostumadas às tais intercorrências na saúde, em
quantidade e gravidade, a avaliação é que ao final tudo daria certo. Ela estava
sem febre, e a saturação 98%. Ou seja, se fosse infecção, não ter febre era um
bom sinal. E aos 81 anos, portadora de DPOC, a oxigenação estava muito boa.
Ali na tal ala laranja da
emergência, sua história final começou a ser escrita, com as anotações no que
chamam de prontuário médico, mas na verdade é o prontuário do paciente. Um
conjunto de documentos padronizados, ordenados e concisos, destinados ao
registro de todas as informações referentes aos cuidados médicos e paramédicos
prestados ao paciente. Hoje conquistei o tal distanciamento necessário para
ler, reler o prontuário de minha mãe. Uma história, ao que me parece, cheia de
curiosidades e de mistérios.
Os primeiros sistemas de
prontuário eletrônico começaram a surgir nos Estados Unidos a partir dos anos
60 (Século XX), desenvolvido por Larry Weed. No Brasil, foi em 2002 que o
Conselho Federal de Medicina (CFM) delimitou as características que esse
documento deveria apresentar. O principal objetivo? Modernizar o trabalho das
unidades de saúde e facilitar o acesso às informações dos pacientes. Ele traz
agilidade, mas por vezes é manuseado pela equipe médica como um mero registro
de dados, e requer uma gestão de qualidade, de modo a não comprometer o
acompanhamento clínico do paciente.
Logo no início da minha
leitura, me chamou a atenção o registro “sem queixas de dor no momento” (da
entrada na unidade médica e enquanto aguardava internação). Como assim? Minha
mãe reclamava de dor ao menor toque, no corpo inteiro, e esse detalhe nos preocupava
particularmente, pois aparentemente não tinha motivo, explicação. Ela passou os
três meses de internação com queixa de dores no corpo inteiro e ao menor toque.
O motivo. Não sabemos. Ninguém soube, ninguém explicou. Será que não procuraram
a causa? Ou não a encontraram?